A graduação é um período que marca para sempre a nossa vida. Local onde nascem amizades, amores e principalmente, modula o início da nossa carreira profissional. É comum jovens de 17 e 18 anos iniciarem seu curso de Zootecnia, Medicina Veterinária, Agronomia, Agronegócio ou Laticínios. São jovens que chegam na universidade sem entender bem como o mercado de trabalho funciona e como se preparar ao máximo para a nova vida que começa em 5 ou mais anos. Ainda, é comum recebermos na Universidade, por mais no interior que ela esteja (como o caso da Universidade Federal de Viçosa) estudantes que nunca tiveram contato com o meio rural. E isso não é problema algum, pelo contrário, para quem quer aprender e tem força de vontade, saber nada é melhor do que saber errado e não estar disposto a mudar. De qualquer forma, o que vemos é que por melhor que a universidade seja, apenas as disciplinas do curso não são suficientes para a formação do estudante de tal modo a suprir a necessidade do mercado de trabalho.
Os estágios, iniciações científicas e grupos de estudos são peças fundamentais do quebra cabeça que o estudante precisa juntar para se capacitar. Foi pensando nisso que na Universidade Federal de Viçosa, há 240 km da nossa capital, Belo Horizonte, foi criado o Programa Família do Leite. Desde 2012, quando o Programa nasceu, professores do Departamento de Zootecnia, contando com apoio de colegas de outros departamentos têm proporcionado aos estudantes a possibilidade de treinamento na Unidade de Ensino, Pesquisa e Extensão em Gado de Leite (UEPE-GL), realização de estágios externos, assistência técnica a produtores rurais da região de Viçosa e atuação em diversas pesquisas científicas que são conduzidas pela instituição.
Durante esses anos, já passaram pelo programa dezenas de estudantes que hoje são profissionais de sucesso e atuam em diversas áreas da bovinocultura leiteira no Brasil. A grande maioria dos estudantes que permaneceu no Programa por no mínimo 18 meses ficou conseguiu emprego ou uma vaga de mestrado após a formatura. Por ser um programa do Departamento de Zootecnia, o foco sempre foi a nutrição e a gestão. No entanto, uma fazenda de leite é bem mais complexa que essas duas linhas, por isso ao longo dos anos fomos incluindo outras vertentes para deixar nosso estudante ainda mais preparado. Qualidade do leite, reprodução, lavouras e sanidade do rebanho foram fazendo parte das atividades realizadas durante as visitas técnicas aos produtores. Dessa forma, hoje quando chegamos numa propriedade para iniciar o trabalho, olhamos a fazenda como um todo, fazendo o planejamento de volumosos, formulando dietas para diminuir o custo sem prejudicar a produção/reprodução, ensinando o produtor e seus funcionários o melhor manejo de ordenha para melhorar a qualidade do leite e por fim entregamos um relatório de custos completo, mostrando ao produtor como a sua atividade está em relação a outras atividades.
No entanto, o caminho até o estudante chegar na etapa de prestar assistência ao produtor é um pouco longo. Isso porque ele precisa se preparar antes, para cometer menos erros possível. Dessa forma, a 1ª ETAPA do Programa se inicia na UEPE-GL, uma fazenda de leite dentro da UFV e pertencente a mesma instituição, que produz diariamente 1.200 litros de leite entregues ao Laticínios Viçosa, responsável pelo melhor doce de leite do Brasil. Durante 1 semestre o estudante vai aprender a levar vaca para a ordenha, ordenhar, fornecer leite para os bezerros, auxiliar no trato, limpar as camas das vacas e assim por diante. Ou seja, é uma etapa de entendimento da fazenda. Nesse momento temos 20% de desistência, é quando o estudante entendo o quanto o gado de leite é complexo e não pode faltar, faça chuva ou faça sol, de domingo a domingo, incluindo horários noturnos para a nossa terceira ordenha. Absolutamente normal os 20% desistirem.
Após vários treinamentos técnicos e avaliações, os estudantes aprovados nessa etapa passam para a 2ª ETAPA do Programa, onde ficarão por 2 semestres. A UEPE-GL é dividida em setores: administrativo (IDEAGRI), vacas, ordenha, cria e recria, reprodutivo, sanidade e lavouras. Os estudantes passam por 4 setores, a depender do curso que faz. Hoje nós aceitamos estudantes da zootecnia, veterinária, agronomia, agronegócio e laticínios. Durante esses dois semestres os estudantes tomam conta do setor junto com outros colegas, aprendendo os desafios do trabalho em equipe. Quem é do setor vacas, faz análise de matéria seca e Penn State, envia amostra para o laboratório realizar a bromatologia da silagem e outros alimentos, analisa pH urinário, Ca pós parto, corpos cetônicos e assim por diante. Os que fazem parte do setor sanidade são responsáveis por todos os casos clínicos com apoio do Departamento de Veterinária da UFV, cuidam do protocolo de vacinação e fazem a ronda para avaliar a saúde dos animais. Estudantes que cuidam do setor ordenha são responsáveis pelo controle leiteiro, coleta de amostras para CCS individual, NUL, CBT, fazem o plaquemento em caso de mastite, cuidam dos tratamentos das vacas e claro, realizam a ordenha. Os estudantes do setor reprodutivo inseminam, fazem avaliação ginecológica, palpam e utilizam ultrassom para realização do diagnóstico de gestação, acompanham a TE, aplicam hormônios para IATF e muito mais. Em resumo, os estudantes da segunda etapa têm responsabilidade de quem já é formado e além disso, batem ponto eletrônico para controle da entrada e saída na fazenda, uma maneira de criar nos estudantes a responsabilidade com horários e compromissos.
Durante os dois semestres na segunda etapa, que chamamos de “Conhecendo a Vaca”, os estudantes recebem mais de 10 treinamentos, os aprovados vão para a etapa de ESPECIALIZAÇÃO. Nesse momento eles vão optar por uma das 5 possibilidades que temos: 1) Assistência técnica aos nossos 20 produtores de leite em parceria com a CRESOL e a Prefeitura de Viçosa, 2) Pesquisa, 3) Família do Leite Tech, 4) Consultoria Jr/estágios em grandes fazendas ou 5) Família do Leite International.
A pesquisa é indicada para os estudantes que pretendem fazer pós graduação, assim, acompanham os experimentos dos pós graduandos e vão melhorando o seu currículo. A Família do Leite Tech é voltada para os alunos empreendedores, e temos como case de sucesso a Volutech, vencedora do IDEAS FOR MILK em 2019, uma startup que produz um aparelho instalado em tanques de leite para medir de forma digital temperatura e volume e envia essas informações para o celular do produtor e laticínios. A consultoria Junior é voltada para projetos pontuais e os estudantes fazem estágio de férias em grandes fazendas em parceria com a DSM. Como exemplo de fazendas temos a Lageado, Grande Leiteira Eudes Braga, Fazenda Sertãozinho entre outras. Por fim, temos o Família do Leite International, voltada para estudantes com perfil de pós graduação que fazem estágio nos EUA e outros países na Europa, como Holanda. Esses estudantes são indicados para aperfeiçoar suas habilidades em pesquisa e deixar o inglês fluente.
Nesses 8 anos de trabalho os desafios são enormes, mas muito já foi feito em prol da formação dos estudantes. Um dos desafios que enfrentamos nesse momento, a pandemia do COVID-19, nos fez reinventar o modo de trabalho, utilizando as tecnologias para treinamentos a distância e interações com produtores e empresas. Durante esses meses de distanciamento social organizamos 12 Lives Técnicas pelo Instagram com mais de 10 mil visualizações e 2000 pessoas ao VIVO nos acompanhando. Recebemos os principais pesquisadores do Brasil e do Mundo para essas discussões.
Hoje temos 80 estudantes que muito se empenham em aprender e buscar conhecimento para que assim, sejam bons profissionais para ajudar a cadeia do leite se fortalecer ainda mais.
Estrutura do Programa Família do Leite